É PRECISO CHORAR!
- Sessão de Psi
- há 5 horas
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Mar Adentro
É preciso chorar.
As lágrimas são a chuva da gente,
nuvens do nosso tempo íntimo precisam desabar.
É preciso chorar,
lágrimas são os rios do ser,
as cachoeiras da gente,
mudam nosso tempo simples,
atualizam nosso mar.
É preciso chorar,
é preciso a natureza copiar,
é preciso aliviar e molhar a seca do coração.
Se não chover vira sertão,
morre homem,
morre gado,
morre plantação.
(Elisa Lucinda)
Por onde desaguamos? Que modos de expressão oferecemos aos nossos sentimentos? Qual a importância do choro? O poema nos adverte: “é preciso chorar!”, indicando uma necessidade que nos soa como algo vital e indispensável, caso contrário podemos nos encontrar áridos, sem vida.
Pensar no choro é pensar numa forma de expressão de afeto, com infinitas modalidades, tonalidades e texturas. Chora-se de alegria, de tristeza, de euforia, de rir! Há um choro que é contido, teatral, catártico e tímido. Para alguns parece mais fácil, as lágrimas escorrem espontaneamente, sem contenções; para outros, a porta de acesso lacrimal está sempre trancada, onde as águas buscam forçadamente outro destino ou simplesmente se encontram represadas, buscando saídas. O choro, às vezes, pede silêncio e reclusão. Outras vezes pede apelo, abraço, acolhimento, sempre convocando a presença de um outro. Choramos de rir, em comemoração, celebrando um momento, um evento ou uma ocasião; mas choramos também na rememoração: pelas lembranças, ao escutar uma música, ao ver um filme, ou simplesmente diante de algo que nos provoca, de maneira inesperada, com memórias que nos tomam de assalto.
Chorar pode significar a emergência de um afeto, conferindo uma realidade corporal para certas emoções que a palavra ainda não alcança. Às vezes, ele transforma os afetos: algo que até se sabia dizer e nomear, mas que o choro chega antes. Antecede a palavra, por vezes a inibe, impedindo o sujeito de falar (é o corpo quem fala, através do sujeito). O choro é uma linguagem, representa algo.
Evidente sua importância fisiológica, como na redução do estresse. Mas além de um ato físico, é também um ato poético: uma composição daquilo que é inominável.
As vezes chorar exige recolhimento, um tempo próprio. Cecília Meireles disse em seu poema “Canção”: “Quero um dia pra chorar, mas a vida vai tão depressa!”. Será que a cultura contemporânea e seu tempo acelerado nos rouba esse tempo de chorar? Que espaço temos para dar lugar a essas águas? Onde elas desembocam?
Me lembro de inúmeros memes nas redes sociais que dizem algo assim: “quando você quer chorar, mas tem uma vida adulta” ou então “gente, só não chorei hoje porque tinha muita coisa pra fazer”. Por essas e outras, brincando ou não, estamos dizendo do pouco espaço que muitas vezes temos para expressar o que sentimos.
Por outro lado, o choro também tem uma representação social de fraqueza, sobretudo aos homens, com a máxima: “homem não chora”. Ele também expõe uma vulnerabilidade, uma sensibilidade que tantas vezes é negada por nós.
De todo modo, o choro é descarga. Algo se modifica depois, simples ou complexamente. Inundados por alguma coisa, desaguamos, escorremos, extravasamos. É como disse Itamar Assumpção em sua música “Milágrimas”: “Mas se apesar de banal, chorar for inevitável, sinta o gosto do sal (...) a cada mil lágrimas, sai um milagre”.
E você, tem chorado? Por onde tem deixado desaguar suas lágrimas?
Por Vitor Ramos
CRP 06/149076

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