Escrever é confundir a solidão
- Sessão de Psi
- 14 de jul.
- 2 min de leitura
Desde adolescente comecei a escrever meus sentimentos. Era um melodrama engraçadíssimo, aos meus olhos de hoje. Entretanto, é uma viagem no tempo revisitar tais cadernos. Na época, no furor de algumas vivências inéditas, foi uma saída que me gerava um certo alívio. Era como uma rota para que eu pudesse depositar meus transbordamentos (ainda é). Ao mesmo tempo que sozinhos, quando escrevemos estamos sempre endereçando aquilo a um outro - mesmo que, ás vezes, esse outro seja a gente mesmo.
Por isso a confusão: solitários, mas não sozinhos. Ou seja, não se trata de nos livrarmos da solidão, mas de conviver, momentaneamente, com ela de outro modo. Escrever sobre si e/ou sobre outros mundos é uma festa em que nos arrumamos para um encontro “da gente com a gente”, mas não só. Nesse sentido, guarda algumas semelhanças com fazer terapia. Parece ser uma via em que é possível se equivocar, se estranhar, se admirar, se emocionar e se surpreender… Reler uma escrita própria é se identificar e desidentificar, ao mesmo tempo: reconhecemos nosso eu e percebemos que ele já não existe mais da mesma forma, algo mudou.
Estou lendo um livro que se chama “A louca da casa”, da Rosa Montero, uma mistura de romance, com ensaio e autobiografia. O nome do livro faz referência à instância da imaginação e ao longo da obra, a autora fala um pouco sobre alguns aspectos do que envolve o processo criativo da escrita (recomendo!). Nesse ínterim, ela faz alusão de que tem algo parecido no estado do apaixonamento e no processo de escrever um romance:

“Amando você é eterno. Da mesma maneira, quando está escrevendo um romance, nos momentos de graça da criação do livro, sente-se tão impregnado da vida dessas criaturas imaginárias que, para você, não existe tempo, nem a decadência, nem a sua própria mortalidade. Você também é eterno ao inventar histórias. A gente sempre escreve contra a morte” (p.10)
De alguma maneira, parece que escrever tem a ver com algum tipo de salvamento: da morte, da angústia, do vazio, da falta, da saudade, do tempo…
Nessa trilha do salvar-se, Conceição Evaristo, cunhou um conceito interessantíssimo,

chamado “Escrevivência”. O termo aglutina a palavra “escrever” e “vivência”. Tal conceito remonta a ideia de que na escrita de vivências marcadas por questões de gênero e raça, não se escreve apenas sobre si, mas sobre uma coletividade. Desse modo, o que se escreve traduz também a cultura, a história e relações de poder que as permeiam. Nesse sentido, a escrita pode se apresentar como uma poderosa ferramenta contra o racismo e sexismo.
Pensar na escrita e seus múltiplos sentidos/efeitos é um terreno muito potente e também inesgotável. Muitas vezes não escrevemos pelo medo e por este cada um tem seus motivos. Escrever exige, sim, coragem. Entretanto, pode também ser um passeio amistoso.
E você, já se aventurou pela escrita? Deixo aqui este convite!
Por Maria Caroline Ofsiany
06.145073
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